sábado, 1 de março de 2008

ÀS AVESSAS

Andava insatisfeita com a vida e tudo que dizia respeito a ela já há bastante tempo. Que será que estava acontecendo que tudo que começava, ou ficava por terminar ou apenas se acabava das piores e mais loucas maneiras? Depois de muito pensar, chegou a conclusão de que o problema era ela mesma. Havia nascido com uma pequena falha de fabricação que lhe impedia de concluir satisfatoriamente qualquer tarefa, até as mais cotidianas. Culpou-se, chorou, se desesperou, até o dia em que se apaixonou. Ai foi o completo caos. Se em pequenas e desimportantes coisas já fazia tanta porcaria, imagine no abstrato e intrincado jogo de amar, suscitar e manter amor? Seria a imagem mais nítida e perfeita do fracasso. Mas ele estava ali e não tinha opções mesmo. O jeito era encarar de frente essa "coisa" que se apossa da gente e faz liquidificador das vontades e desejos daqueles que são contaminados pelo danado. Tinha certeza que seriam erros mil; acreditava-os certos e líquidos como suas pernas ao se defrontarem com o objeto do seu desejo. Histórias de contos de fadas? Pura ilusão pra essa desajeitada mulher, que fez dos erros sua principal característica. Mas como tudo ali era diferente, foi exatamente amando que aprendeu que seus erros, longe de a tornarem menor, a haviam enrijecido pras lutas cotidianas e mais condescendente para as falhas alheias, coisa imprescindível em qualquer relação. Errou uma, duas, infinitas vezes... Errou e aprendeu a refazer e refazer-se; aprendeu a perdoar e perdoar-se; a tentar e tentar novamente. Até que um dia fez tudo certinho, é certo que teve ajuda, pois descobriu que nessa vida ninguém erra sozinho. Até pra isso há que se ter companhia. Hoje, quando olha sua vida, sorri serena e é constante ouvi-la contar aos netos, que estão sempre a rodeá-la, suas inúmeras histórias dos tantos erros que cometeu. E como em contos de fadas às avessas, é assim que começa:
- Erra uma vez...

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