quarta-feira, 8 de agosto de 2007

CAMINHANTE

Nunca havia caminhado verdadeiramente só, mas sentia-se solitária.
As companhias, que por longos ou pequenos trechos de vida lhe haviam servido de presença, eram apenas figuras indistintas, nunca dotadas de maior importância.
Nunca lhes pedira apoio nos piores trechos; não lhes contara das bolhas dolorosas causadas pelos terrenos pedregosos ou do cansaço que muitas vezes lhe dominara o corpo, fazendo com que ansiasse por uma parada, pequena que fosse.

Sentia-se solitária porque sua caminhada era feita por terras estranhas, países estrangeiros... Faltava-lhe um lar...
Quem a via não lhe enxergava as cicatrizes. Acreditavam-na imune à passagem do tempo, pois ali a amargura não havia fincado suas raízes. Ela ainda confiava que o futuro pudesse levá-la àquele recanto a tanto tempo sonhado. Tantas vezes olhada e tratada como menina frágil e despreparada para as inconstâncias deste mundo muitas vezes cruel. Tantas vezes poupada de verdades que a fariam crescer e refletir, por subestimarem-lhe a força interior...
Nunca vislumbraram ali a guerreira forjada nas durezas e decepções do tempo. Mas ela estava ali. Sempre ali.
Revestida da couraça de sorrisos que sempre se impôs na esperança de ser aceita. Irrestritamente aceita.
Necessidade imensa de sentir-se amada e “em casa”.
Por vezes até acreditou ser possível. Por vezes até pensou ter chegado. Por vezes até sonhou... Mas logo a parede de encantamento ruía e lá estava ela diante do mesmo quadro já tão familiar; quadro de paisagem desértica onde sua figura era o único ser a habitar... Cena de solidão...
Que fazer diante da desesperança? Lutar contra? Pode parecer fácil a principio mas, com o tempo, somos subjugados pela sua força; tornamo-nos descrentes. Assim ocorreu aqui...
Mas o Tempo, este poderoso e inexorável Tempo, mostrou a verdade quando a vida já havia sido preenchida de mentiras e ilusões. O Tempo mostrou você.
Trouxe-o para a minha vida em momento de completo descrédito neste sentimento tantas vezes cantado e poetizado, mas por tão poucos vivido em sua plenitude. Que fazer diante do que ora me acontecia?
Esta foi a primeira pergunta a ecoar na mente e coração já tão desgastados de ilusões.
A primeira resposta foi dada pela Emoção:
__ Fuja minha amiga! Fantasias são belas quando contadas em livros, com personagens fictícios, nunca são belas quando somos nós a vivê-las e sofrê-las.
Escutei atentamente seu conselho e até me decidi a segui-lo, mas aí veio a Razão e disse-me:
__ Porque não fica e vê o que pode acontecer? Que tens a perder? Receba os carinhos, mesmo que nem sejam verdadeiros e mantenha-se distante. Não se envolva ou se entregue e estarás segura.
A partir daí começou uma briga entre minha enorme emoção e aquela pequenina (e nunca cultivada) razão. Parecia Shakespeare em sua eterna dúvida entre ser ou não ser. Fico ou parto?
Mantive-me quieta e passiva. Nada fiz para atrair, não me movi para repelir. Quieta e imóvel me mantive. Outra ilusão, pois minha passividade deixou-me à mercê do danadinho do amor que veio se chegando devagarzinho e traiçoeiro se instalou por aqui. Quando percebi sua presença, já não era mais possível retornar.
Amor é bichinho que quando se aloja, parece vírus polimorfo; quando você o descobre, ele já se espalhou pelo corpo e alma de tal forma que para extinguí-lo é preciso extinguir quem o carrega, e nem isso é 100% seguro.
E foi assim que me aconteceu. Joguei por terra teorias cuidadosamente construídas em 36 anos de vida planejada e controlada por minhas vontades. Perdi aquela mania de dirigir atos; esqueci do orgulho que me fazia seguir adiante sem olhar pra trás e que machucava quem não conseguia me acompanhar os passos; tornei-me mais humana, enfim.
Culpa do danado do Amor. Culpa daquele que me contagiou com sentimento que transborda através dos olhares apaixonados que me lança; das palavras carregadas de emoção que me escreve ou diz.
Culpa sua, toda sua...
Mas se a culpa é sua, a felicidade é minha... Me descubro melhor a cada dia; me descubro amando mais... Mesmo pensando que o sentimento já é maior que o mundo, daí a pouco percebo que ainda encontra espaços para se expandir sempre mais... Amo sem medos; tenho certeza que sou amada como jamais o fui: plena e intensamente, ignorando barreiras e distâncias... Apenas amando e buscando a felicidade neste sentir que contagia, embriaga e nos faz sonhar uma vida mais real...
Já não me imagino caminhante solitária... Encontrei meu lar quando descobri que nesta paisagem existe alguém que se arrisca por mim... Que se lança comigo do mais alto monte neste vôo pelos céus dos afagos, carinhos e prazer no qual nos alçamos e pretendemos voar pelo resto dos tempos que esta vida nos quiser proporcionar...

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