quarta-feira, 8 de agosto de 2007

JOSÉ

José era moço simples, sem nenhum destes requintes dos homens da cidade. Vestia-se sempre com roupas da mesma cor, mesmo modelo, mesmo tecido; economizava na compra de peças inteiras, que sua mãe costurava sempre iguais.
Quem o olhava de longe imaginava pessoa simplória, sem sonhos, ambições ou pensamentos desalinhados. Sequer imaginavam o mundo interior que habitava ali dentro, nunca lhe perguntaram.
À noite, quando se deitava na cama limpa, de lençóis cheirando a sabão de abacate que a mãe insistia em produzir e que ele nunca tivera a coragem de dizer o quanto cheiravam mal, seu mundo se abria e, no escuro do quarto, a luz surgia.
Nos sonhos, José era falante, malandro e admirado pelas mocinhas do povoado, que emitiam suspiros apaixonados a cada passagem sua. Não lhes dava trela, era muito pro bico de todas elas.
Seu destino era sempre a última casa do final da rua, onde vivia o prefeito e sua família. Chegava, abria o portão familiar e entrava sem esperar convite. Era dono daquele lugar e das pessoas que o esperavam à mesa do jantar.
O perfume do pão misturava-se às colônias que as mulheres usavam, fazendo com que a comida ganhasse um sabor peculiar, que não encontrara em nenhum outro país ou casa, dos tantos que já visitara.
Os sorrisos de alegria pela sua chegada faziam a sala brilhar ainda mais, lembrando-o sempre do quanto era amado. Mas em meio ao jantar, surgia sempre a figura intrusa daquele que dominava o ambiente durante o dia, hora em que José, ocupado com a lida diária, estava fora.
Entre empurrões e xingamentos, José era posto pra fora, jogado na sarjeta das calçadas imundas, lembradas apenas pelos ratos que por ali passeavam tão logo o sol se punha, certos de sua discrição.
Os ratos, ávidos em alimento para manter seus corpos, fitavam o pobre José, faminto em sustentar seus sonhos e fantasias.
Entendiam-se, eram pares num mundo que deixa ao largo aqueles que parecem diferentes dos padrões pequeno burgueses das pequenas ou grandes cidades.
Ratos-homens ou homens-rato, subgente perdida da vida real, que busca na escuridão da noite alento ao espírito cansado e desesperançado.
Se encontram o que buscam ? Somente eles possuem a resposta...

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